Entrevista Dep. Fed. Alice Portugal
Redação
 Alice Portugal começou sua vida política, ainda na época da ditadura militar, mais precisamente na década de 70. Através da política estudantil na Universidade Federal da Bahia (UFBA), participou ativamente do Diretório Acadêmico, Diretório Central dos Estudantes, dirigiu greves e ajudou na reconstrução da União Nacional dos Estudantes (UNE). Sempre se pautou na constituição de uma consciência pela luta de uma universidade pública e democrática.

Formou-se em Farmácia Bioquímica, e entrou para o quadro de funcionários do Setor de Pesquisas do Hospital das Clínicas da UFBA. Continuou atuando politicamente presidindo por 15 anos o Sindicato de Servidores da Universidade. Em 1994 foi eleita deputada estadual na Bahia, pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Exerceu dois mandatos consecutivos, sendo líder da oposição por três vezes e compondo comissões importantes na Assembléia Legislativa. Ainda na mesma casa combateu com veemência o "Carlismo". Em 2002 foi eleita deputada federal reelegendo-se em 2006 com uma votação bastante expressiva, obtendo votos em 416 dos 417 municípios baianos.

FR - O Carlismo acabou na Bahia?

AP - Não, o Carlismo é um sistema muito mais enraizado do a gente possa imaginar, ele está nas instituições, ele está na constituição de uma holding de jornal, televisão, sites e outros. Há todo um engendramento construído em cima do dinheiro público, que está aí à disposição destas forças oligárquicas de direita e que a Bahia tem que abrir os olhos, para virar o destino dos municípios, essa deve ser a meta dos baianos, viramos a Bahia, viramos o Brasil, ainda com timidez, iniciando um processo de mudanças no País. Nós precisamos mudar a lógica da política dos municípios, acabar com essa visão utilitarista, acabar com essa visão de compra dos votos dos munícipes, de engano coletivo e de vemos cidades belíssimas e históricas como Ilhéus, nesta situação que nós estamos vendo hoje. É dramática a situação dos municípios baianos, nos precisamos de fato mudar na raiz.

FR - Quais as suas principais lutas no Congresso Nacional?

AP
- Eu fui eleita deputada federal pela segunda vez, e inclusive apontada no DIAP uma das que forma opinião no Congresso Nacional, e muito me honrou o DIAP ter me colocado como elaboradora educacional brasileira. Isso não sai no jornal, porque o que sai no jornal é denúncia de navalha, de mensaleiro, de sanguessuga e os meus mandatos são pautados na defesa do estado nacional, do serviço público, na defesa de direitos pétreos dos trabalhadores brasileiros, previdência social, salário mínimo decente, política salarial para os trabalhadores. Nas teses educacionais, a revitalização das universidades públicas, a criação do CEFET, como aqui inclusive no sul da Bahia eu fui a deputada quem indicou em 2005 a criação do CEFET que agora vem para essa região e objetivamente a região foi mapeada do ponto de vista da centralidade, não municipalmente, do ponto de vista da centralidade dos municípios. Nossa vitória é essa vitória de trazer CEFET, de lutar por uma Universidade Federal nesta região, para Jequié que também foi uma indicação minha está lá nos autos da câmara está registrado, então nós não fazemos pirotecnia, nos traduzimos as lutas por políticas públicas, por defesa dos direitos da mulher, da criança e do adolescente em projetos concretos que tem nos mantido no parlamento por tantos anos.

FR - O que seria a causa de tantos escândalos, a exemplo da Navalha, Mensalão entre outros?

AP -O problema está efetivamente em uma raiz cultural lamentavelmente atrasada em que o individual é colocado acima do coletivo, primeiro isso, essa raiz utilitarista de que política é mecanismo de se dar bem, e não mecanismo de fazer o bem à toda a coletividade, a arte de convencer para transformar. Esse hábito cultural tem que ser mudado, e ensinar ao povo a ter "olhos de ver" como diria Rui Barbosa, não tem ninguém nomeado no congresso nacional é todo mundo eleito Maluf, Clodovil, Alice, Gabeira todos são eleitos, não tem ninguém nomeado, então a sociedade também tem que se responsabilizar por esse tipo de situação, porque ela é repetidora quando indica pessoas que são conhecidas publicamente por esse tipo de ação. O sistema eleitoral é injusto, ele é completamente desigual, não há eqüidade, então você não pode dizer que é a mesma coisa eu me eleger do que o neto do senador Antonio Carlos se eleger, eu não tenho nada, ele tem tudo. Eu defendo o financiamento público da campanha para acabar a desigualdade, todos vão ter o direito de gastar aquele teto, acima dali é crime, na medida em que você cria o financiamento público e proíba empresas de financiar campanhas você vai diminuir muito a corrupção, porque boa parte destes que aparecem nas operações da Polícia Federal, alguns deles não tem patrimônio, quando você vai ver ele não tem patrimônio, o que foi que fez ele pegar dinheiro de empreiteiro, foi a campanha eleitoral. É preciso mudar a regra eleitoral, não justifica pegar dinheiro com empreiteiro, mais explica é para campanha eleitoral, nós temos que acabar com a hipocrisia e mudar a regra eleitoral, discutir o fortalecimento dos partidos, porque nós somos um País de homens fortes e partidos fracos, literalmente homens porque dos 513 deputados temos apenas 45 mulheres, isso também tem que ser discutido nas listas partidárias. Tudo isso nós temos que discutir com muita propriedade sem tabus, sem preconceito explicando à sociedade a realidade, não mitificando, apenas colocando os escândalos como se a corrupção fosse generalizada e não é verdade, você tem uma quantidade de políticos que se corrompem, como você tem uma quantidade de juizes que se corrompem, de médicos, de engenheiros, em todos os extratos a sociedade brasileira você vai encontrar ação ilícita e a natureza corruptível, mas nós precisamos mudar a cultura e a lei.

FR - Como Alice Portugal vê a evolução do PCdoB ao longo destes 85 anos de história?


AP -
Eu me orgulho muito de está em um partido, que de fato é um partido, não é uma frente, não é um aglomerado, não tem tendência é um partido na acepção da palavra, sofreu muito, destes 85 passou boa parte do tempo clandestino, e não legal. Por isso mesmo nós temos mais dificuldades e somos contra a clausula de barreira por isso, porque nós não somos pequenos por opção, nós somos pequenos porque ficamos nas masmorras, porque muita gente morreu, muita gente sumiu, a região do cacau conhece isso mais do que eu. Objetivamente o nosso partido veio a tona com uma luta em 86, o PT foi legalizado em 80 e o PCdoB ficou na ilegalidade até 86, a ditadura não permitia, só quando ocorreu de fato o fim literal da ditadura, antes da constituição com a primeira eleição em colégio eleitoral é que nós conseguimos a legalidade, quando os militares saíram do Governo é que nós conseguimos a legalidade. Hoje nós vivemos em um Governo Lula em plena legalidade, e participando pela primeira vez de um governo em 85 anos os comunistas participam de um governo, para nós é motivo de uma experiência importante, nós achamos que o Governo Lula é um governo de frente, de transição é um mix político, é portanto um governo de coalizão você tem de comunistas, socialistas, democratas até homens que tem visão conservadora. Nesse perfil é que nós encontramos acolhimento para idéias mais avançadas que a história da República do Brasil tem notícia, apesar dos problemas nós apoiamos esse governo por entendermos que foi o primeiro de fato a ter olhos para sociedade brasileira e para os mais pobres.

FR - Como vossa excelência vê o novo momento da política baiana com a vitória de Jaques Wagner?


AP -
O Brasil derrubou a ditadura em 86, a Bahia acabou de derrubar a ditadura. Para nós é de fato o grito de liberdade, é a primeira manifestação após Waldir de indignação com o modelo concentrador da riqueza, autoritário no método que dirigiu a Bahia por 40 anos. Para nós é uma grande vitória, nós estamos no Governo Wagner com a Secretária de Trabalho na figura do professor Nilton Vasconcelos, e esperamos que de fato ele tenha êxito, não será muito fácil, nós sabemos, não é fácil governar um Estado que mais trezentas prefeituras continuam na mão do Carlismo, por parte de grandes empresas ainda tem laços com eles, nós vamos vencer, romper e essas correntes e com certeza fazer com que a Bahia tenha uma vida mais justa.

FR - Em relação às ações do Governo Wagner, qual sua avaliação?


AP - Muita coisa aconteceu, desbarataram-se os escândalos como na EBAL, nós estamos tratando de fazer um orçamento participativo, agora o sul da Bahia acabou de viver o seu PPA, o Plano Plurianual para produzir as políticas, é a primeira vez na Bahia que se produz política ouvindo as pessoas. Agora na saúde, por exemplo, já rompe com a privatização imposta por essas falsas cooperativas, fazendo concursos públicos, acaba com a atitude clientelista do REDA, que agora será por seleção pública, não vai haver perseguição, não vai haver demissão em massa, isso tudo são sinais do governo. Também há problemas, ainda a política salarial para os servidores não é ideal, vão acontecer lutas, greves, mais na democracia é assim, cabo de guerra quem puxar o cabo em defesa do movimento social sai ganhando, por isso eu apoio também essas lutas.

FR - Atualmente a cidade de Ilhéus vive uma crise entre os Poderes Legislativo e Executivo, como você vê esta situação?


AP - Os poderes são independentes, devem ser harmônicos entre si, mais em primeiro lugar está a defesa da sociedade. Se o Legislativo descobre atos ilícitos do Executivo tem usar seu poder legislador para afastar efetivamente quem não merece a confiança do povo. Então a democracia ela é exatamente tripartite para não ser autoritária. Os poderes devem ter harmonia, mas trabalhar independentemente para que um fiscalize o outro. Quando a improbidade é apontada e comprovada, nós temos que ter a coragem cidadã de afastar quem não merece de estar no poder.

 
 
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